terça-feira, 30 de agosto de 2022

O paleoambiente de Kem Kem

 Como vai, caro internauta? Peço perdão pela demora na publicação desta e de outras postagens que virão. Todavia, ainda abordando aspectos básicos sobre o Grupo Kem Kem, hoje comentarei um pouco sobre seu paleoambiente.

 Digo previamente que este post tem a intenção de ser curto. Para mais detalhes, cheque esta excelente publicação científica (e referências contidas nela) do paleontólogo Nizar Ibrahim e colaboradores. A publicação breve e anteriormente citada será usada como referência na maioria das postagens do blog, além disso.

 Mas o que exatamente significa a palavra paleoambiente? O termo “paleo” é um prefixo que deriva do grego antigo palaiós (que significa antigo, velho, primitivo). Com isso, já dá pra matar a questão: um paleoambiente é um ambiente antigo. A pesquisadora M. Elaine Kennedy, ademais, define paleoambiente como “um ambiente que foi preservado no registro rochoso em algum momento no passado”.

Aspecto geral

  O Grupo Kem Kem deve ser visto como uma cabeceira de um sistema fluvial grande de condições áridas a semi-áridas que segue para o norte em forma de um delta progressivo. Haviam rios e lagos e o cenário terrestre era preenchido em grande parte por araucárias, em especial semelhantes às do gênero Agathis, e pela samambaia Weichselia reticulata; enquanto que nas águas, por exemplo, pteridófitas do gênero Marsilea podiam ser vistas (parte dessas informações paleobotânicas são baseadas num comentário do paleontólogo Tom Parker no Twitter, pois não as achei na literatura). 

 Diferentemente da Formação Bahariya, Kem Kem não tem depósitos de manguezais costeiros. Ibrahim et al. (2020a) argumenta que o melhor análogo africano atual do Grupo Kem Kem é o Delta do Níger.

Foto do Delta do Níger disponibilizada em Domínio Público pela NASA.

Representação esquemática dos estágios paleoambientais do Grupo Kem Kem (para mais informações, veja os parágrafos abaixo). Imagem retirada de Ibrabim et al. (2020a).

Formação Gara Sbaa

 Evidências sedimentológicas indicam que na parte inferior da Formação Gara Sbaa havia um sistema fluvial de pequena escala (estágio 1 da imagem acima) que, ao avançar do tempo geológico, se transformou em canais fluviais mais amplos e profundos (estágio 2). Já na parte superior, a Formação Gara Sbaa possivelmente começou a receber influência da maré, o que, junto com o tamanho dos canais, é indicativo de que o ambiente nesse momento era deltaico. Por causa disso, alguns corpos d'água se tornaram de água salobra. 

 Acho válido comentar, também, que Krassilov & Bacchia (2013) inferiram para a Fm. Gara Sbaa um paleoclima (clima antigo) semelhante ao subtropical levemente seco do oeste das Ilhas Canárias.

Formação Douira

 Na Formação Douira, a influência da maré continua. Houve preponderância de canais fluviais, planícies aluviaisaberturas de fendas (que são importantes para a preservação de pegadas de dinossauros) e havia também um lago de água doce na localidade de Oum Tkout (estágio 3). A porção mais superior da Formação Douira foi “invadida” por ambientes marinhos marginais de águas rasas (estágio 4), onde habitavam os Conichnus e as anêmonas citadas no post anterior.

Evolução 

 É possível perceber que, ao decorrer do tempo, o paleoambiente de Kem Kem evolui. Ele passa de um ambiente fluvial para deltaico e de um ambiente deltaico para um ambiente costeiro, sabkha e “lacustre”.

Ilustrações 

 Gostaria de compartilhar aqui o trabalho do paleoartista e curador Ole Zant. Suas paleoartes são maravilhosas e as que escolhi retratam bem o paleoambiente de Kem Kem. Compartilharei o link dos tweets, pois não consegui contatar Zant para conferir se eu poderia colocar as imagens em si no blog. 

 Primeira paleoartesegunda paleoarte.

Referências

Kennedy, M.E. (1998). Paleoenvironments. In: Geochemistry. Encyclopedia of Earth Science. Springer, Dordrecht.

Ibrahim N, Sereno PC, Varricchio DJ, Martill DM, Dutheil DB, Unwin DM, Baidder L, Larsson HCE, Zouhri S, Kaoukaya A (2020) Geology and paleontology of the Upper Cretaceous Kem Kem Group of eastern Morocco. ZooKeys 928: 1-216.

Krassilov, V.; Bacchia, F. (2013). New Cenomanian florule and a leaf mine from southeastern Morocco: Palaeoecological and climatological inferences. Cretaceous Research

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